12/23/2011

O pássaro de ouro

Era uma vez um pássaro de ouro, um pássaro dourado como o sol, brilhante como a lua, livre como as lágrimas das cascatas selvagens... nascidas por entre as mais virgens florestas escondidas pelo breu nocturno. Um ser único que só pelo seu respirar libertava a vida do seu ser. Como todo o brilho... era cobiçado... e onde existe a luz... existe a sombra. O pássaro de ouro sentia-se mal no meio das sombras pois achava que o seu brilho as poderia envergonhar, não gostava que os outros se sentissem mal com a sua presença, gostava de passar despercebido e queria ser um pássaro normal como todos os outros, decidiu então... deixar-se poluir de forma a se aceitar a ele mesmo. Aos poucos foi perdendo o seu brilho, a sua luz... a sua liberdade, aos poucos ia perdendo a sua essência... a sua identidade, esquecendo-se de quem era. Um dia... já fraco e vulnerável, foi pisado numa das suas asas e perdeu a capacidade de voar... aprendeu a rastejar por entre as árvores que outrora sobrevoou, aprendeu a sobreviver escondido por entre as raízes do chão... alimentou-se das sementes que lhe iam sendo levadas pelo vento, aprendeu através da humildade, compaixão e bondade que sentia perante a sombra... que a esta só lhe interessava o extinguir do seu brilho, que se não existir brilho... não existe a essência. A sombra era egoísta e queria guardar o pássaro de ouro só para si... esquecendo-se de que quando se nasce com essência pura, basta amar para voltar a brilhar incondicionalmente. Foi através do amor que sentia pela sombra que uma réstia de luz se acendeu dentro do pássaro de ouro. Esta réstia de luz não passou despercebida aos outros animais das florestas... que perguntavam entre si o que era feito daquele pássaro dourado que quando passava aquecia, que quando voava, inspirava todos à sua passagem... que quando brilhava... era amado e inspirava ao brilho. Abandonado... e só... o pássaro começou aos poucos a amar aquele pássaro desconhecido e do qual todos os animais da floresta falavam, quem lhe dera conhecer esse pássaro sagrado, esse pássaro divino que nunca tinha tido o prazer de conhecer... por consequência foi brilhando mais e mais sem se aperceber disso. A sombra... matreira e invejosa, dizia-lhe que ele era filho da lama deixada pela chuva, ele cego e sedento de aceitação... acreditava e voltava a brilhar menos... mas nunca deixou de amar aquele pássaro que gostava tanto de conhecer. Um dia... rastejava um caracol de casca meia partida, um ancião sobrevivente... que lhe disse que tinha conhecido esse pássaro de ouro e que ele o fazia lembrar muito aquela imagem esvoaçante... mas que era um caco daquilo que conhecia, se já tinha reparado que por entre as suas penas descoloradas nasciam uma ou duas douradas e com brilho... gritou bem alto para que os outros animais se aproximassem e confirmassem o achado. Todos disseram que era o pássaro de ouro desaparecido, incrédulos de como se tinha tornado tão igual e sem cor... havia uma pequena poça de água no chão onde o pássaro se olhou e também confirmou que as penas lhe nasciam sem sequer reparar... incrédulo e atordoado relembrou-se de quem era, sorriu... amou-se... e como que por magia desfez-se em cinzas e renasceu das mesmas... ainda mais brilhante, ainda mais puro... pois foi necessário descobrir por si mesmo que antes mesmo de querer ser igual à sombra para se sentir aceite... já o era por todos os seres que o rodeavam, que só faltava a ele mesmo amar-se assim como já era, como sempre foi... agora, antes de sobrevoar a escuridão grita ressonantemente:

- Esconde-te! Pois não te quero magoar...
nem com o meu brilho te cegar...
se queres ser como eu...
só tens de a ti... te amar.